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domingo, 20 de setembro de 2009

A TRAGÉDIA FEMINIMA NO BRASIL 2009

A tragédia e a esperança dentro das carceragens para mulheres

por peruano última modificação 17/09/2009 17:26
SEGURANÇA Amontoadas em celas precárias, cariocas se desumanizam; programa promete repor parte da dignidade perdida
SEGURANÇA  Amontoadas em celas precárias, cariocas se desumanizam; programa promete repor parte da dignidade perdida
Leandro Uchoas
do Rio de Janeiro (RJ)


ELAS TÊM AS mãos delicadas e o corpo frágil como as outras. E, por vezes, também a voz suave e a mesma ternura nos gestos. Contra elas, ainda não se comprovou totalmente nada. Nenhuma culpa juridicamente reconhecida. Entretanto, amontoam-se em jaulas precárias, daquele jeitinho escandaloso que a sociedade brasileira se acostumou a ignorar.
Nas carceragens, prisões destinadas a pessoas em julgamento, as mulheres representam de 2% a 5% dos detentos. Embora estejam em quantidade menor em relação aos homens, são mais vulneráveis à desumanidade carcerária.
Devido à menor força física, ficam mais expostas a violências de toda ordem. Em algumas unidades do país, são exploradas sexualmente pelo próprio agente penitenciário. Em outras, deixam de receber cuidados específicos das mulheres, desde absorventes até visitas masculinas.
Sua trágica condição, porém, tem encontrado esperanças no Rio de Janeiro. “Já tivemos aqui 160 internas. Conseguimos reduzir para 139. O ideal era atingir, pelo menos, 90. Mas o que chega eu tenho que receber”, reconhece o inspetor Araújo, chefe da carceragem feminina de Mesquita, uma das três unidades do Rio de Janeiro.
Na 53ª DP desde maio, o funcionário tem a incumbência de implantar no local o programa Carceragem Cidadã.
Desenvolvido em Nova Iguaçu (RJ) pelo delegado Orlando Zaccone, o projeto visa dar humanidade às detenções (neste ano, Zaccone tornou-se responsável pelas 22 unidades cariocas). No programa, uma série de atividades de reconhecimento da cidadania do preso são implementadas.
A julgar pelos desafios visíveis em Mesquita, o trabalho será árduo. O motivo da maior parcela de prisões costuma ser banal. Em geral, as meninas são detidas por acompanhar o namorado ou marido em atividade ilícita. É raro encontrar uma interna que tenha sido condenada por crime relevante. “Dizem que a gente vive num país de impunidade.
Isso depende da categoria. No crime do colarinho branco, sim. Em compensação, temos 500 mil presos no Brasil. É presa a mulher que furta uma lata de salsicha. Passa a custar R$ 2 mil por mês ao Estado. É irracional”, acusa Roberta Pedrinha, do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos (IDDH).
O perfil de Talita Ferreira, de 20 anos, é um bom exemplo de como funciona o encarceramento de mulheres. Está em Mesquita há cinco meses. Foi presa porque acompanhava o marido portando drogas. Na carceragem, ela foi “promovida” a colaboradora, função destinada a detentas de maior confiança. No posto, desempenha atividades administrativas do local. Dorme no quarto mais estruturado e, a cada três dias de trabalho, diminui em um o período de prisão. Talita já foi ameaçada de morte por outra detenta. “Sempre existe esse tipo de ameaça. Mesmo que você não fale nada, você vai ganhar a fama de X9 [dedoduro]. E se você é transferida para um presídio, chegando lá é cobrada”, conta.

Peculiaridades
As carceragens femininas têm – ou deveriam ter – uma série de especificidades. Difere das carceragens masculinas em aspectos que vão do espaço físico ao relacionamento com a polícia. “Até o jeito de você lidar tem que ser diferente. A mulher é mais sensível”, diz Araújo. A peculiaridade mais evidente é a relativa à maternidade. Mulheres grávidas têm que ser acompanhadas por profissionais.
A partir do sétimo mês são transferidas para outra unidade, melhor equipada, e têm direito à presença do filho durante o aleitamento. “A figura feminina dentro da família tem uma representação muito forte, um laço afetivo muito especial. O afastamento entre a mãe e os filhos agrava ainda mais o quadro dessas mulheres.
A separação, depois do aleitamento, é difícil para ambos os lados, mãe e filho”, diz Pedrinha, do IDDH. Em geral, atos sexuais com homens durante o período de cárcere são raros. O motivo é o abandono dos companheiros, outra peculiaridade de carceragens femininas. Os homens raramente visitam suas mulheres na prisão. É o inverso do que ocorre nas unidades masculinas. “Isso gera uma depressão brutal. As mulheres acabam ficando agressivas.
E têm os escapes, a procura por drogas. As mulheres criam dependências que muitas vezes não tinham antes de entrar”, lamenta Pedrinha. Por conta da ausência de visitas masculinas, a homossexualidade nas carceragens femininas ocorre com constância muito maior. Mulheres que trabalham com presos costumam dizer que são mais respeitadas em carceragens masculinas. Mais até do que nas unidades dos homens, o ato homossexual ocorre frequentemente contra a vontade de detentas recém-chegadas.
Em Mesquita, Ana Márcia de Paula foi prontamente “promovida” a colaboradora quando chegou. Jovem e bonita, deixou as detentas em alvoroço em seu primeiro dia. O inspetor Araújo logo protegeu, com o “cargo”, a menina que se agarrava a seu braço, amedrontada.
“Quando chegam presas novas, você vê o medo nos olhos delas. Até porque são mulheres, e quem está lidando com a gente são homens. Como trabalhamos aqui na frente, vemos tudo”, conta Patrícia de Souza. Na unidade há 10 meses, ela é a mais respeitada das colaboradoras. Empolga-se com a implementação do Carceragem Cidadã. “Estão começando a tratar a gente como pessoa. Hoje se pensa que, mesmo presa, a gente pode progredir, ser diferente”, diz Patrícia, uma das poucas detentas originárias de classe média.

Autoestima
As meninas de Mesquita têm recebido, há um mês, atendimento jurídico. A iniciativa veio de uma parceria com o Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam). Na companhia de seus alunos, o professor Marcelo Branco visita a unidade toda terça-feira para estudar os casos das detentas. “Quando vejo que uma pessoa está desassistida, eu abraço a causa.
Para os alunos vale como estágio. Nós estamos ajudando um ao outro”, explica.
Pedrinha considera importante as iniciativas do Carceragem Cidadã no sentido de reforçar a autoestima nos presídios. Ela cita outros casos bem-sucedidos no Brasil.
“Em algumas carceragens do Nordeste, as presas estudam e trabalham. E o trabalho está muitas vezes associado ao embelezamento. Por exemplo, uma presa faz o cabelo ou a unha da outra. Com isso, passam a se sentir melhor. Na escola, têm um rendimento melhor. É um investimento humano”, considera.
A partir do projeto “Mulheres Detentas e Atentas”, em implantação, a carceragem de Mesquita visa mapear o pensamento, a ação e o discurso dessas mulheres. Com os resultados, pretende-se elaborar políticas públicas específicas e de reinserção social. Ainda muito distante do ideal, a unidade da Baixada Fluminense parece estar no caminho certo.

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